Pesquisa desenvolvida pelo Cendhec aborda desigualdades de gênero na Educação

Estudantes de oito escolas públicas do Recife, Igarassu e Camaragibe participaram de um pesquisa desenvolvida pelo Centro Dom Helder Camara de Estudos e Ação Social (Cendhec), com apoio do Fundo Malala, para perceber os efeitos das desigualdades de gênero na vida escolar de meninas. Realizada com 438 estudantes do ensino fundamental II das redes, o levantamento faz parte das ações do projeto Na Trilha da Educação. Gênero e Políticas Públicas para Meninas e mostrou que uma a cada 4 meninas sofre preconceito em ambiente escolar e que 26,9% das meninas entrevistadas alegaram terem sido afetadas por algum tipo de prejulgamento/repúdio em suas instituições de ensino. Entre elas, 38,1% atribui a ação ao racismo: 27,1% por ter cabelo crespo/enrolado; 11,0% por ser negra;

Além de racismo, assédio, LGBTQIA+fobia, trabalho doméstico e falta de incentivo para a prática de atividades esportivas são alguns dos problemas apontados pelas adolescentes. Os primeiros resultados da pesquisa, encabeçada pela entidade que há 33 anos trabalha na defesa e promoção de direitos humanos, serão apresentados e destrinchados durante o seminário “Meninas por uma Educação com Igualdade”, que tem inscrições gratuitas até dia 13/11. O evento será ralizado no próximo 16 de novembro no auditório Dom Helder Camara, Bloco A, na Universidade Católica de Pernambuco. O encontro reúne educadoras/es; estudantes; representantes das secretarias municipais e gestões escolares das cidades parceiras do Cendhec.

A pesquisa foi realizada entre os meses de março a setembro de 2022  por meio dos métodos quantitativo (aplicação de questionários) e qualitativo (grupos focais). Além da adolescentes, também responderam ao questionário no método quantitativo gestoras/es e professoras/es. No método qualitativo, um grupo de 71 meninas participou de rodas de discussão sobre desigualdade de gênero e educação, sendo 35 estudantes matriculadas no fundamental II e 36 jovens que estão fora da sala de aula, com até 21 anos. Mães de estudantes também foram entrevistadas.

Pedagoga do Cendhec, Paula Ferreira é integrante da Rede de Ativistas pela Educação do Fundo Malala (Rede Malala) e também atuou na mobilização da pesquisa. A ativista acredita que o enfrentamento às desigualdades de gênero é um desafio que precisa ser encarado pelas secretarias de educação e gestões escolares. “Vivemos em uma sociedade estruturada pelo machismo e isso faz com que muitas meninas enfrentem barreiras na escola. Para combater as desigualdades de gênero no ambiente escolar é preciso que as três redes parceiras do Cendhec, e que participaram da pesquisa, possam pensar em ações e projetos para garantir uma educação mais inclusiva para meninas, principalmente negras e que estão em vulnerabilidade social. Esse levantamento oferece dados importantes para pensar nas melhores estratégias”, pontua.

Das meninas entrevistadas em Igarassu, Recife e Camaragibe, 59,1% responderam não saber o que é desigualdade de gênero, ao mesmo tempo, 66% acham que meninas e meninos não têm os mesmos direitos na escola. Sete em cada dez afirmam que seus professores não discutem o tema, porém 94,1% apontam que debater direitos de meninas e meninos é necessário. Aproximadamente 60% das estudantes acreditam que existe preconceito em relação às meninas praticarem esportes. Segundo elas, este preconceito é demonstrado pelos meninos, que foram citados em 91,5% das respostas. Um percentual de 26,5% das estudantes afirmaram se sentirem desconfortáveis com comentários sobre suas roupas.

Assédio na escola e problemas como ansiedade atingem as meninas

A pesquisa revelou que 31,5% (sendo 7,1% muitas vezes + 24,4% algumas vezes) já se sentiu incomodada com atitudes/comentários de meninos. Dessas, 54,4% (sendo 11,9% muitas vezes +  42,5% algumas vezes) sentiu que havia maldade, segundas intenções. 53,8% não contou pra ninguém sobre essas atitudes. Racismo: Uma a cada 4 meninas sofre preconceito em ambiente escolar. De acordo com o levantamento, 26,9% das meninas entrevistadas dizem terem sido afetadas por algum tipo de prejulgamento/repúdio em suas instituições de ensino. Das vítimas, 38,1% atribui a ação ao racismo: 27,1% por ter cabelo crespo/enrolado; 11,0% por ser negra.

Quase metade das meninas em idade escolar se queixam de ansiedade, que foi intensificada pelo período de pandemia. A pesquisa apresenta que a maioria (48,9%) das meninas entrevistadas se diz, na maior parte do tempo, ansiosa. Ao todo, 68,3% das consultadas sentiram que a pandemia afetou sua saúde emocional, 65,9% disseram que a tristeza as abalou no período, outras 27,8% conviviam com o medo de perder alguém. Sem aulas presenciais, o desenvolvimento delas também sofreu um duro golpe. Os números mostram que 55,5% das meninas relataram ter dificuldades para participar de aulas remotas, 43,2% destas atribuíram à dificuldade de acesso à internet. Ainda segundo o levantamento, 48,2% afirmam ter percebido prejuízos importantes em sua aprendizagem durante a crise sanitária.

Coordenadora do Programa da Criança e do Adolescente e coordenadora adjunta da instituição, a cientista social Katia Pintor pontua que a pesquisa considerou aspectos como classe, raça e gênero.  “Ouvir as meninas ajuda o Cendhec a ter elementos para fazer com que essas vozes sejam ecoadas e transformadas em ação, em políticas públicas que garantam direitos previstos na Constituição de 1988 e no Estatuto da Criança e do Adolescente. Essa pesquisa é muito importante para que o trabalho do nosso centro de defesa siga cada vez mais fundamentado”. Além da apresentação dos resultados, durante o seminário o Cendhec entregará às secretarias de Educação uma carta de recomendações produzida pelo centro, a partir da experiência do projeto.

Sobre o Na Trilha da Educação. Gênero e Políticas Públicas para Meninas

O projeto tem entre as suas principais premissas: educação como direito fundamental; escola como espaço de proteção para garantia dos direitos das crianças e adolescentes; e direitos iguais para meninas e meninos independente de cor, raça, classe social, identidade de gênero ou religião. Além de incidência política, ao longo de dois anos, “Na trilha da Educação” promoveu formações, ações de comunicação para disseminar as pautas de enfrentamento às desigualdades de gênero e a articulação da rede de proteção. Desenvolvida desde 2020 pelo Cendhec, a iniciativa conta com apoio do Fundo Malala e tem como objetivo contribuir com a formulação de políticas que promovam o enfrentamento às desigualdades de gênero na educação pública para promover a autonomia e o desenvolvimento integral das meninas.

“A pesquisa é uma ferramenta muito importante para conhecer os problemas que as meninas enfrentam nas escolas. A partir desses dados e informações, o poder público pode elaborar estratégias e políticas que garantam a equidade de gênero nas escolas”, diz Maíra Martins, representante do Fundo Malala no Brasil. A Rede de Ativistas pela Educação, estabelecida pelo Fundo, tem o objetivo de investir, apoiar e dar visibilidade ao trabalho de ativistas pela causa em dez países: Afeganistão, Bangladesh, Brasil, Etiópia, Índia, Líbano, Nigéria, Paquistão, Tanzânia e Turquia. No Brasil, a Rede Malala conta com 11 integrantes e suas organizações, incluindo Paula Ferreira, do Cendhec.

SERVIÇO

Seminário “Meninas por uma Educação com Igualdade”

Local: Universidade Católica de Pernambuco, Auditório Dom Helder Camara, Bloco A
Data: 16/11

Horário: das 9h às 12h

Escrito por:

Afoitas Jornalismo

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