Monalisa Nunes e a revolução do mercado dermatológico para mulheres pretas

Comunicadora por natureza, a baiana Monalisa criou a primeira clínica dermatológica vegana que atende mulheres pretas

Texto: Eduarda Santos

Você conhece a palavra “pluralidade”? Na língua portuguesa quer dizer “[…] fato de existir em grande quantidade, de não ser único; multiplicidade, diversidade.” No mercado de beleza atual, pluralidade é o que as marcas de cosméticos começaram a ter em suas prateleiras: bases com mais de cinco tipos de cores, blushes em tons diferentes de rosa e roxo, corretivos e pós com cores extremamente escuras para uma só finalidade: inclusão.

No início dos anos 2000, tudo que uma menina de idade média queria era ser bonita, e tudo que o mercado de cosméticos e a mídia oferecia era a “beleza branca”. As propagandas eram feitas em cima do ‘medo de ser feia demais’, ninguém queria ter a pele com manchas ou espinhas, e até mesmo escura. Todas as modelos e famosas que apareciam em revistas e nas TV ‘s eram brancas, e nenhuma menina preta tinha como referência outra mulher preta para se inspirar.

Até hoje em dia, principalmente com a ascensão das redes sociais e influencers, as mulheres e meninas mais jovens sentem uma pressão muito forte em serem bonitas, não só pessoalmente, mas virtualmente também, e no meio disso tudo a mulher preta está em constante cuidado com sua imagem, já que para ser “vista” muitas vezes ela precisa estar
muito mais ‘montada’ que uma mulher branca, e qualquer deslize é um risco à sua visibilidade na sociedade.

Os movimentos sociais que aconteceram nos últimos anos, como a dos cabelos naturais ajudaram bastante no aumento do mercado de cosmético para mulheres pretas no Brasil, antes uma base num tom extremamente escuro era muito difícil de encontrar. Hoje, essa realidade mudou e marcas como, por exemplo, a Fenty Beauty — marca de cosméticos da Rihanna— oferecem em torno de 50 tons de pele em seus produtos.

Porém, o mercado ainda é bastante escasso. Em 2020, um estudo da Nielsen mostrou que apenas 5,9% das vendas no mercado nacional correspondem a produtos destinados à pele negra. E, além disso, os preços desses produtos podem ser até 50% mais caros do que produtos para pele branca. No mercado dermatológico não difere, segundo a pesquisa Demografia Médica de 2022, do CFM, o Brasil conta com 9.685 especialistas em Dermatologia, representando 4,61 especialistas a cada 100 mil habitantes, porém o que mais vemos nas redes sociais e até mesmo nas propagandas da televisão é a frase “clareamento” e essa luta para o não escurecimento natural da pele.

Foi para mudar essa realidade que a dermatologista e blogueira Monalisa Nunes criou a Derma Vegan, primeira clínica dermatológica 100% vegana e para pele preta. “Precisamos parar de delegar a nossa imagem aos profissionais ou a outras pessoas para que eles digam o que devemos mudar em nós mesmos. A mudança deve vir se for uma queixa sua, se for algo que organicamente te incomode, e aí sim, buscaremos o melhor para cada demanda”.

Monalisa atende mulheres pretas e afirma que é necessário ouvir e dar voz a a este público nos consultórios médicos. “Sinto que as mulheres negras vêm muito calejadas de terem esse olhar julgador sobre suas imagens. Afinar nariz, prescrição de produtos que são clareadores também, não olhar para as características da pele preta, não ter esse preparo e olhar cuidadoso mesmo. Então, a primeira coisa é ouvir. A escuta é super importante, entender as vivências dessa paciente, o que a incomoda, suas experiências e entender que cada pele é uma pele, cada pessoa tem uma necessidade e que o atendimento será direcionado especialmente para cada paciente que chega até mim. É o que busco fazer e sempre tentar devolver a autoestima dessa mulher, que, infelizmente, muitas vezes vem com experiências negativas”.

Quem é Monalisa Nunes?

Monalisa é uma mulher preta e baiana que passou sua infância toda sonhando em ser médica, e conseguiu esse feito ao passar na Universidade Federal de Alagoas no curso de Medicina: “Não sei se posso dizer que foi difícil me adaptar naquele espaço, pois sempre mantive um foco muito grande em meus objetivos acadêmicos, mas definitivamente foi solitário em muitos momentos, já que eu era a única mulher negra na minha sala”, conta ela. Foram justamente esses momentos que deram força para Monalisa seguir em busca do seu propósito.

“Vivenciar essas desigualdades nesses ambientes, perceber de forma escancarada como a área da Medicina é elitista e que poucas pessoas pretas conseguem ter acesso, fez crescer em mim essa vontade de fazer diferente, de buscar uma medicina diferente, de falar mais abertamente sobre isso e trazer um atendimento diferenciado para essas pessoas que não tinham suas necessidades ouvidas.”
A Derma Vegan é a primeira clínica dermatológica e estética vegana do Brasil e assegura a todas às pacientes sobre os procedentes dos produtos usados nos procedimentos estéticos. “Trazer para elas a segurança de que todos os produtos prescritos e expostos para teste são veganos, que desde o café até a paçoquinha oferecidas na clínica são veganos e toda a atmosfera da clínica remetendo à natureza e buscando ser um refúgio da loucura do dia a dia, é a minha maior realização. Por isso, quis trazer todo conhecimento científico da dermatologia associado à prática vegana.”

Além de médica dermatologista, Monalisa também é blogueira e seu Instagram hoje junta a faixa de 305 mil seguidores, onde ela compartilha dicas de beleza vegana para mulheres pretas e compartilha da sua rotina como médica. O trabalho feito nas redes sociais ajuda de diversas formas a valorizar a beleza negra. “Prego a saúde, o bem-estar e a busca por uma estética que não sirva para nos aprisionar, nos pressionar e nos fazer dependentes dela, tampouco, para nos colocar em padrões.” E continua: “Por isso acho importante sempre trazer essa pauta nas mídias sociais, falar do papel dos filtros na nossa autoimagem, das comparações, das ilusões que a internet proporciona, e com isso espero conseguir ampliar essas discussões e fazer com que mais mulheres se percebam como mulheres lindas e potentes e que não dependem de procedimentos estéticos para se amarem e se verem como belas”.

“A beleza empodera, mas ela tem que ser usada a nosso favor e não contra nós”. É assim que a dermatologista provoca a sociedade a repensar padrões especialmente para mulheres pretas, que vivem eternamente num relacionamento de amor e guerra com a beleza. Neste sentido, o ativismo de profissionais como Monalisa Nunes provam que a pele negra é negligenciada e com especialização podem ter o mesmo acesso à saúde que a pele branca tem, não só dermatológica, mas em todas as áreas da Medicina.

Escrito por:

Eduarda Santos

eduarda.santanasantos@ufpe.br