Mostra Entremoveres reúne mais de trinta artistas negras e não-brancas no Museu da Abolição a partir do sábado (4)

Evento faz parte da articulação pernambucana para a mostra nacional Trovoa, que em 2019 ocorre em sete estados brasileiros, e apresenta a diversidade da produção das mulheres e pessoas não-binárias no estado, além de atividades formativas abertas ao público

Infinitas possibilidades de discursos e abordagens norteiam a ocupação artística Entremoveres, que acontecerá também em Pernambuco, com abertura no próximo sábado (4), às 16h, no Museu da Abolição no bairro da Madalena. O evento compõe a articulação e mostra nacional Trovoa, idealizada por um coletivo de artistas e curadoras cariocas, e em Pernambuco conta com a participação de mais de 30 artistas, entre mulheres (travestis, trans e cis) e pessoas não-binárias que apresentarão através de seus trabalhos artísticos e atividades formativas, a pluralidade de linguagens, de discursos, de pesquisas e de mídias produzidas por profissionais que, não raro, tem sua atuação racializada no campo artístico. A visitação segue até o dia 4 de agosto com entrada gratuita e algumas oficinas abertas ao público.

No mesmo dia da abertura, haverá também uma roda de conversa no auditório do Museu da Abolição com as participantes, que irão falar sobre o processo individual e coletivo de construção da Entremoveres, que tem levantado diversas discussões éticas e estéticas, presenciais e virtuais. A mostra conta, atualmente, com trabalhos das artistas Aline Sales, Amanda Souza, Ana Lira, Anne Souza, Ariana Nuala, Benedita Arcoverde, Biarritzzz, Deba Tacana, Erzulie Timboiá, Gi Vatroi, Ianah, Juma Gitirana, Kalor, Karla Fagundes, Kildery Iara, Letícia Barros, Lia Letícia, Liz Santos, Magú, Mariana de Matos, Mitsy Queiroz, Nathê Ferreira, Nena Callejera, Polly Souza, Priscilla Buhr, Priscila Ferraz, Priscilla Melo, Preta Afoita, Rebeca Gondim e Mun-Ha. Serão apresentados desenhos, gravuras, vídeo, instalação, livro de artista, lambe-lambe, fotografia, performance, entre outras expressões e linguagens que podem ser acrescentadas no decorrer da mostra.

Artistas participantes da Entremoveres seguram placas com os nomes das demais artistas desta que é a mostra Trovoa Nacional em Pernambuco. Mais de 30 mulheres e pessoas não-binárias apresentarão seus trabalhos no Museu da Abolição, no bairro da Madalena. Foto: Abiniel Nascimento/Divulgação

Artistas participantes da Entremoveres seguram placas com os nomes das demais artistas desta que é a mostra Trovoa Nacional em Pernambuco. Mais de 30 mulheres e pessoas não-binárias apresentarão seus trabalhos no Museu da Abolição, no bairro da Madalena. Foto: Abiniel Nascimento/Divulgação

A ocupação artística consiste em um laboratório em processo no Museu da Abolição, desenvolvido pelas próprias artistas ao longo dos três meses de ativação do equipamento cultural, que foi dirigido historicamente por pessoas brancas e que agora vem sendo pensado a partir da perspectiva das pessoas negras. De acordo com a museóloga Daiane Carvalho, diretora interina do Museu da Abolição, o equipamento cultural se engrandece ao acolher a Entremoveres. “Se trata de um resultado desse processo artístico tão lindo e inclusivo, fruto de uma dialética poderosa e muita efervescência criativa de 30 ‘mulé preta’. Toda essa movimentação possui bastante sintonia com a missão e os objetivos da instituição, no sentido de fomentar processos de co-criação, e ser um espaço para conectar-se e compartilhar a história, memória, manifestações culturais e artísticas do povo negro, dando uma atenção mais que especial as temáticas do feminino”, avalia a diretora.

Descontentes com os espaços racializados a que está condicionada a presença das mulheres negras, originárias e não-brancas no campo das artes, a mobilização do Trovoa em Pernambuco pretende apresentar um panorama dessa produção cujos discursos são muito mais amplos. De acordo com a articuladora local Ariana Nuala, a mostra Entremoveres é muito mais que uma apresentação de trabalhos coletivos, trata-se de uma quebra e de uma inserção de novas perspectivas, narrativas e trocas, para um circuito artístico sem espaço para um eixo plural, formatado desde a colonização. “A grandeza está no encontro entre as artistas, a fissura/potência que isso causa, a possibilidade das artistas refletirem juntas sobre seus processos de produção da imagem, se reconhecerem no discurso umas das outras e também criar perspectivas sobre narrativas instauradas. É necessário entrar com o corpo para tensionar ambientes demarcados na história colonial, mas mais potencializar o que está fora deste, o que não é dito como centro”, afirmou Ariana. Assim, os laboratórios e as formações são parte da demanda urgente de ecoar para fora o que já está em processo de criação a muito tempo, porém sem visibilidade e sem espaço nos ambientes potencializadores.

Não se trata de uma discussão que ocorre do dia para noite, já que o movimento conta com artistas, não-artistas, curadoras, pesquisadoras, educadoras, produtoras e comunicadoras sociais independentes que acumulam em sua trajetória profissional uma série de ações e posicionamentos anti-racistas no circuito artístico nacional, sobretudo em Pernambuco, estado que ainda tem muito o que se decolonizar em suas mídias e instituições excludentes. Ainda está em voga a apropriação cultural e a perpetuação de discursos hegemônicos não-condizentes com as reais necessidades da maioria da população aqui vivente, composta majoritariamente por pessoas não-brancas e empobrecidas, residentes nas periferias e no interior.

Levando em consideração a multiplicidade de corpos e também de realidades, a intenção é que, após a abertura da exposição, haja também atividades formativas visando a capacitação e a profissionalização das artistas que, devido aos gargalos do racismo e preconceito de classe, gênero e sexualidade, se encontram ainda à margem não somente dos recursos financeiros públicos e privados, além de também estarem ausentes de ambientes acadêmicos.

Mediante a heterogeneidade dessas pessoas e vivências, a intenção é implementar no Museu da Abolição, além da mostra que ficará em cartaz durante três meses com algumas intervenções previstas no ambiente interno e externo da instituição, uma espécie de laboratório e ateliê coletivo que possa fomentar as práticas artísticas, curatoriais de pesquisa e comunicação a partir da troca de saberes e fazeres entre mulheres negras, originárias e não-brancas.

Programação no Museu da Abolição

Grupo de Estudos em Arte e Decolonialidade com Rodrigo Lopes, bordadeiro, designer e coordenador do Laboratório de Arte Contemporânea (PPGArtes – UFC).
Dias 24 e 25 de maio.
Entre-Frestas – Oficina de Processos Criativos com a artista Ana Lira
Dias: 8 e 15 de junho.
Horário: 9h às 17h)
Bordado livre: Autorretrato e Narrativas de Si, com Liz Santos
Dia: 17 de julho
Horário: 15h

SERVIÇO:
ENTREMOVERES – Mostra Trovoa em Pernambuco
Abertura no dia 4 de maio, às 16h e, visitação até 4 de agosto, no Museu da Abolição (R. Benfica, 1150, Madalena).
Visitação de segunda à sexta, das 9h às 17h, e aos sábados das 13h às 17h.
Informações: (81) 991387984

Escrito por:

Kalor Pacheco

kalorpacheco@gmail.com

 @umapinoia