Lúcia de Badia, guardiã da memória preta do Pátio do Terço

Texto e imagem: Lenne Ferreira

Lúcia Soares dos Santos, mais conhecida como Lúcia de Badia, já não tem mais vizinhos no Pátio do Terço, onde vive desde a infância. A casa de conhecidos deu lugar ao comércio de artigos diversos, principalmente os importados chineses, que viraram o rostos familiares no dia a dia do bairro de São José. Em um território de significado histórico para o povo preto, onde Badia criou a Noite dos Tambores Silenciosos, Lúcia, filha de criação da outrora celebrada carnavalesca mais popular do Recife, tenta manter viva uma história que herdou e que vem sofrendo com o apagamento e falta de iniciativas de fomento.

A partir desse mês, Lúcia reinaugura um novo capítulo na tentativa de manter viva a memória afro do local que só é lembrado no período Carnavalesco, quando a Prefeitura do Recife promove programação. Para acender a atividade cultural do Pátio do Terço, ela reabre o restaurante AfroLuz – Culinária ancestral. O projeto é desenvolvido há mais de 60 anos por Lúcia, que, além de cozinheira, é brincante popular. O restaurante funciona dentro da Casa de Badia, equipamento histórico tombado, mas praticamente esquecido pela gestão pública.  A reabertura marca a mobilização pela valorização e reconhecimento do território onde também viveu o poeta e escritor Solano Trindade.

A reinauguração acontece com uma celebração regada a Frevo e afoxé, ritmos que fazem parte da história do local. Os desfiles dos clubes Elefante de Olinda e Vassourinhas do Recife, Afoxé Oxum Pandá e Afoxé Oimim sabá aninam a festa. Para a cozinheira, ver o espaço reocupado pela cultura negra ao longo do ano é uma realização pessoal. “Esse lugar é muito importante para o Recife. Por aqui, foram criados blocos históricos de Carnaval e ele precisa voltar a ser valorizado pela nossa população”, pontua Lúcia, que mora no Pátio do Terço há 60 anos e é presidente da Troça Carnavalesca Mista Coroas de São José.

A dama do Carnaval do Recife

Neta de africanos, Maria de Lourdes Silva, popularmente conhecida como Badia, nasceu no Recife no dia 9 de abril de 1915 e virou símbolo da identidade e cultura negra da cidade, além de representante da religiosidade afrodiásporica. A mãe de santo, que também era costureira, morou a vida inteira no Bairro de São José em Recife (reduto de descendentes de escravos libertos que se tornaram trabalhadores de baixa renda). O local onde ela morava ficou conhecido como Axé das Tias do Pátio do Terço ou Casa das Tias, tendo sido organizado e liderado por ela e outras “xangozeiras”. Alguns estudiosos consideram que a Casa das Tias é modelo mais antigo do xangô de Pernambuco.

Badia foi uma das responsáveis direta pela criação da Noite dos Tambores Silenciosos, evento que acontece sempre no Pátio do terço, no centro de Recife, na segunda-feira de carnaval e que representa uma mescla de religiosidade com expressão artística popular. A Noite reúne maracatus vindos de várias partes de Pernambuco e o povo de terreiro que, à meia-noite, quando as luzes do bairro são apagadas,  entoam cantos e rezas para homenagear os negros escravizados e pedir proteção aos orixás.

Serviço
Sexta (29/09), 16h
Reinauguração do AfroLuz – Casa de Badia (Pátio do Terço, bairro de São José)

18:00 – Evolução dos porta-estandartes dos clubes Elefante de Olinda e Clube Vassourinhas do Recife.

19:30 – Solenidade de Abertura do Restaurante Afroluz

19:45 – Afoxé Oxum Pandá

21:00 – Afoxé Oimim sabá

Escrito por:

Lenne Ferreira

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